– Crônicas e Críticas; Humor e Acidez; Idéias Espinafradas por Tiago Xavier

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A Civilização do Espetáculo de Mário Vargas Llosa

Este texto foi escrito inicialmente para o blog “Revolta na Bottega” (fechado apenas para os participantes), criado pelos alunos do programa de doutorado em Educação, Arte e História da Cultura da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Apesar de aquele ser um blog escrito por estudantes de doutorado,  o texto abaixo não seguiu nenhuma das normas acadêmicas de publicação.

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Não é uma tarefa fácil definir o conceito de Cultura, justamente pelo seu caráter polissêmico. Nos últimos cinquenta anos, este conceito está ficando cada vez mais confuso, e consequentemente, cada vez mais contraditório. Basta uma análise breve no uso que se faz da palavra cultura nos diversos meios de comunicação para verificarmos que, sob a sombra deste conceito, tudo, ou quase tudo, encontra abrigo – do cultivo de maconha à criação de suínos, passando por culinária, gastronomia, cinema, teatro, música, moda, desenhos animados, tecnologia digital, eteceteras e mais eteceteras… .

A palavra cultura tornou-se um adjetivo de prestígio, sendo incorporada nas mais diversas atividades humanas com intuito claro de sua valorização, dando mais importância a um determinado produto que ultrapassa o seu real significado. No mundo contemporâneo, o conceito de Cultura foi banalizado tornando-se extremamente abrangente, ou seja, tudo é cultura.

Diante dessa análise, uma pergunta se faz pertinente àqueles que se empenham no estudo na História da Cultura: devemos lamentar o fato de a cultura ter se tornado um espetáculo ou celebrar o fenômeno de essa espetacularização disponibilizá-la para um número cada vez maior de pessoas?

No último dia 17 de abril, no teatro Geo, em São Paulo, ocorreu a abertura da edição 2013 de um evento chamado “Fronteiras do Pensamento”. Há três anos em São Paulo e há seis em Porto Alegre, o projeto traz, a essas duas cidades, acadêmicos e intelectuais de diferentes áreas do conhecimento para discutir questões importantes para este início de século XXI. Neste ano de 2013 o tema central da série de palestras foi o “cosmopolitismo”, como explica o curador do evento, Fernando Schüller, em entrevista à Revista Galileu.

O ciclo de conferências deste ano teve início com o escritor peruano Mario Vargas Llosa. Sua participação no “Fronteiras do Pensamento” deste ano teve como ponto de partida seu livro “A Civilização do Espetáculo”, lançado em outubro do ano passado e que terá uma edição brasileira lançada pela editora Alfaguara, no próximo semestre. Em seu livro, Llosa tenta definir cultura através de um balanço dos vários pensadores e intelectuais que, no século passado, discutiram o conceito – desde o poeta inglês T. S Eliot e seu clássico ensaio em torno da definição de cultura (1948), passando por George Steiner, que respondeu ao poeta inglês mais de vinte anos depois escrevendo o livro “No Castelo do Barba Azul – algumas notas  para a redefinição da cultura” (1971). O escritor peruano também traz as análises sobre o conceito de cultura presentes em “O Mal-Estar na Cultura (1930), de Sigmund Freud , até chegar ao livro capital de Guy Debord, “A Sociedade do Espetáculo” (1967). No entanto, se para o filósofo francês, que tem o pensamento calcado no marxismo, a cultura é o reflexo dos fenômenos sociais, econômicos, políticos e religiosos, para Vargas Llosa é o contrário – a cultura é a fonte de todos estes fenômenos.

Print  Notas-para-a-Definicao-de-Cultura 9727081886  capa_freud04  A Sociedade Do Espetáculo (La Société du Spectacle) (1973)

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O formato de “A Civilização do Espetáculo” – uma compilação de textos de diferentes épocas – traz a ideia, bastante evidenciada pelo autor, de que todas as artes estão mergulhadas no caos devido a inundação de frivolidades a que a sociedade contemporânea está submetida. Alguns exemplos citados por Vargas Llosa – O cinema e a literatura atuais são produtos de fácil degustação, que não exige do expectador um exercício reflexivo. Tudo é muito leve, muito palatável. Um leitor do livro que se encontra no topo da lista dos mais vendidos, com uma história boba e romântica envolvendo vampiros, acredita estar no mesmo plano cultural de um leitor de James Joyce. Estes produtos de fácil degustação, presentes em todas as linguagens artísticas e muito bem divulgados por todos os meios de comunicação, dão a seus leitores e espectadores a impressão cômoda de serem cultos, revolucionários, modernos e de estarem na vanguarda com o mínimo de esforço intelectual. Não a toa que a cultura atual, que se apresenta como avançada, na verdade propaga o conformismo por meio de suas piores manifestações – a complacência e a auto satisfação.

Essa espetacularização amplia e banaliza a base cultural dos produtos mais diversos: desde a moda e a culinária, passando pelo sexo (e sua banalização culminando na perda do erotismo) até aos meios de informação (causando a perda da privacidade). Vargas Llosa está convencido, e todo leitor de jornais pode verificar isso, de que entre Miguel de Cervantes e o jogador de futebol mais famoso da atualidade, ou um astro do rock, a imprensa atual, toda ela, dá preferência em destacar uma matéria sobre estes últimos. A massificação faz com que tudo se misture e nada seja passível de crítica – seja a música, as drogas, o futebol, a pornografia ou as leituras fáceis – tudo, para o escritor peruano são degradações de uma sociedade que não tem uma base cultural para resistir à invasão da obviedade, do comodismo e da estupidez. No mundo do espetáculo, os intelectuais desapareceram do debate público das grandes questões consideradas fundamentais à sociedade, já que o pensamento perdeu a força de influência que desfrutou em outros tempos.

A civilização do espetáculo é caracterizada, segundo Vargas Llosa, pelo empobrecimento de ideias, pela pouca exigência de esforço intelectual e pela frivolidade imperante em todos os campos de atividade humana. A espetacularização é um conceito inerente ao conceito contemporâneo de cultura definido por Mário Vargas Llosa em seu livro, e um dos principais motivos que o levam a afirmar, de maneira categórica, que vivemos em um período em que a cultura chegou ao seu fim, pois não enfrenta os problemas, mas foge deles. A cultura banalizada não é capaz de dar respostas sérias aos grandes enigmas, interrogações e conflitos que rodeiam a humanidade. Apenas respostas lúdicas, que servem para entreter e divertir. A morte da cultura, para o autor de “A Civilização do Espetáculo”, está na transformação desta em uma cultura de superfície e aparência, que não consegue dar conta de responder aos mistérios da complexidade humana.


ALGUMAS CRÌTICAS

A análise de Vargas Llosa parece ignorar o profundo caráter político da civilização do espetáculo, que não é novo – seja a política de pão e circo da Roma Imperial, seja a política contemporânea, tudo é reduzido, incluindo a cultura, a uma espetacularização. Essa é a forma de tornar governáveis os regimes instituídos, como as democracias, em que as elites cedem uma parte do palco às massas, mas não cedem o poder essencial. Quem se manteve no poder com a democratização da “cultura” às “massas” e incorporaram as multidões na organização sistêmica em eventos e espetáculos ? As elites…

Llosa passa por este assunto de maneira um tanto superficial. Me incomoda também o fato de ele defender uma hierarquia cultural, como se os intelectuais fossem iluminados e seu papel, ou função social, fosse o de guiar o restante de homens e mulheres comuns da humanidade, como verdadeiros tutores, na busca de um bem comum. Buscar uma cultura de qualidade (artística, estética, teórica, original) é uma coisa, mas reservar a poucos o direito de dizer o que é e o que não é cultura, retirando do homem simples a capacidade de transcender por meios de suas vivências pessoais, de sua cultura, é um tanto quanto arbitrário. A alta cultura, a cultura erudita, a cultura letrada não dá conta do entendimento da complexidade humana se, com ela, não trabalha junto a experiência, o dia a dia, o viver. A cultura só dá conta de modificar a vida quando realmente fazemos de cada acontecimento do cotidiano uma experiência de vida. Claro que, com a espetacularização, os “excessos” da massa ganharam um carácter festivo e foram integradas nas sociedades do espetáculo – basta ver o povo nas arquibancadas da Copa do Mundo, soprando suas vuvuzelas, como na última copa. Se lembrarmos que o futebol, para seguir o mesmo exemplo, era um esporte de pessoas ricas e hoje é o desporto mais popular do planeta, podemos verificar que as elites, para manterem-se no poder, verificaram que era necessário continuar proporcionando uma parte do seu antigo poder, o da cultura em sentido lato, para as massas. Para se salvarem e lucrarem com isso, foram as elites que escolheram este caminho. Esta é hoje a forma possível de domínio da massa pelas elites, a hegemonia, que é o conceito de Antonio Gramsci. Não sei se Llosa foi um leitor de Gramsci, mas tudo indica a crer que sim.


Morre o Grande Paulo Vanzolini

São Paulo perde um dos seus maiores compositores. Autor de sambas famosos como “Ronda” e “Volta por Cima”. Paulo Vanzolini morreu na noite deste domingo, aos 89 anos , no Hospital Albert Einsten, onde estava internado desde quinta feira passada.

Sem dúvida, sempre foi o meu compositor favorito. Suas canções são crônicas da cidade, que mostram que ainda há poesia na vida.

Além de compositor, foi um grande acadêmico – formou-se em medicina em 1947 e no ano seguinte, foi para os Estados Unidos, onde obteve o doutorado em Zoologia pela Universidade de Harvard. Foi um dos idealizadores da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) e ativo colaborador do Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo.

Deixo aqui, como forma de homenageá-lo, o documentário “Um Homem de Moral” (2009), dirigido brilhantemente por Ricardo Dias,  sobre a vida e a obra do grande Paulo Vanzolini:


O Amor Acaba

Segue abaixo uma musiquinha de minha autoria. Ela é baseada em uma crônica de mesmo nome, do escritor Paulo Mendes Campos. A música eu fiz recentemente, mas a letra eu havia escrito há 14 anos, quando era um adolescente revoltado de 17 anos. Meu pai havia me visitado e esqueceu em casa um livro de crônicas do Paulo Mendes Campos. Tenho o livro até hoje. Relendo o livro, lembrei que essa crônica havia me inspirado a escrever um poema. Comecei a vasculhar  os cadernos velhos e o encontrei, escrito numa folha dobrada. Aí resolvi fazer essa música:

O AMOR ACABA (Tiago Xavier)

A sala ficou vazia de repente
E eu não me despedi na sexta feira
A sala bem vazia,
de repente, a sala fria vivia versos em prosa.

Gente boa e gente inútil
Que berrava e sorria
Mas a alma do homem é boba e vadia.
Quando olhava em seus olhos
me perdoava de todos os crimes cometidos
Meu plenos pecados, assumidos
com a culpa de um assassino.

Pois o amor acaba
e a sala fica vazia.
O amor troca o sol da manhã
pela noite fria.
O amor acaba
numa esquina, por exemplo
no meio da rua.
O amor acaba num domingo de lua.
A qualquer hora, por qualquer motivo
o amor acaba pra recomeçar mais vivo.


Miss Smith To You

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Fazia tempo que eu não ouvia o maravilhoso disco “Miss Smith To You”, de Lavay Smith (acompanhada da banda Her Red Hot Skillet Lickers). Lavay Smith é reconhecida internacionalmente como ” The Queen Of Classic Jazz & Blues” – estilo autêntico da década de 40 e 50. Um jazz pulsante de muita qualidade. Em algumas faixas, da até vontade de dançar, como em “Everybody’s Talkin’ bout Miss Thing”.

Ao vivo, Miss Smith é contagiante:


As pequenas coisas que nos unem – George Carlin